domingo, 29 de novembro de 2009

Curitinopla

                                           para:

                                           manuel bandeira
                                           nelson rebello (oil man)
                                           rodrigo madeira
                                           dalton trevisan
 

Vou-me embora pra Curitinopla
Lá sou amigo do Oil Man
Lá vive a morena que eu quero
Na cidade onde sou refém

Vou-me embora pra Curitinopla
Vou-me embora pra Curitinopla
Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo incongruente
Que um poeta louco da Saldanha
Que versa principescamente
Vem a ser preteritamente
O agora que nunca tive

E farei footing no Barigui
Andarei de bicicleta
Montarei em bi-articulado
Subirei na torre da Telepar
Tomarei banhos de chafariz!
E quando estiver cansado
Deito à beira da ciclovia
Mando chamar o Dalton
Pra me contar as histórias
Que no tempo de eu menino
Ninguém vinha me contar
Vou-me embora pra Curitinopla

Em Curitinopla tem tudo
É outra civilização
Tem um progresso seguro
Tem palhaços no calçadão
Tem lombada eletrônica
Tem cristais à vontade
Tem curitibocas bonitas
Para a gente namorar

E quando eu estiver, assim...
Que nem tarja preta der jeito
Quando de noite pintar
Vontade de me matar
- Lá sou amigo do Oil Man -
Terei a morte que eu quero
Na tumba que escolherei
Vou-me embora pra Curitinopla.

 
RAUL POUGH
 
(*) Adaptação curitiboca do poema "Vou-me embora pra Pasárgada", de Manuel Bandeira.

Milla Jovovich



Roberta


pisou no meu coração
doutor, por favor
um beta-bloqueador

 
RAUL POUGH

I nação

                                           a Raul Pough

Gente, no meio de extremos
ao sol do meio-dia
entre a vida que havia
e a morte que ardia!

Ávida, a avenida ia
incólume, entre os carros
que iam, entre o asfalto
que ria da agonia
e ia com toda a rapidez
atrás das riquezas

Entre o dia e a noite,
entre a flor e o açoite,
entre a dor e o que fosse
dor, gente, no meio ...

Gente dormente, feto refeito
sem o hálito quente
do beijo
do seio materno
do desejo fraterno
de tirar a mente do feio
e repousar no belo

Gente, nas garras da metrópole
presa em octópodes ligas de metal leve
presa às ações caóticas do caos que ferve
e seu encéfalo diabólico

gente ...

e quando percebemos
a miséria que se impõe
pouco notamos que há
gente, no meio de extremos


MAURO VERAS

Por conta de um comentário que fiz sobre seu poema GUETO, abaixo reproduzido, meu amigo e poeta Mauro Veras brindou-me com este outro poema, que nasceu justamente das palavras do tal comentário. Valeu, irmão! 

sábado, 28 de novembro de 2009

Gueto


Não ter a menor razão para nada
tudo seria tão pequeno
tudo seria tão pouco
tudo

pessoas tristes
flores tristes
tardes tristes

e tudo que assistisse
faria assim como fosse morrer

Estrelas que brilharam tanto
inesquecíveis árias de grandes óperas
e hoje me ouvem os ouvidos
cantos de pássaros solitários

pássaros

de voos pequenos
como deveria ser tudo

uma velha negra e suas tetas murchas
a criança negra pendurada nelas
sujas, as bruxas girando em torno da cena
de formidáveis pessoas miseráveis ...

e a prata da cidade
que passa qual estrela cadente,
brilhando tanto!

e nas tetas da mulher, a derradeira gota de sangue

A alma se alimenta de leites improváveis ...
inapetentes almas em seu cruzeiro

Como o valor da Razão ...
como pessoas, flores
como o canto dos pássaros
como este voo rasteiro

Não deveria ter a menor razão para nada
tudo seria tão pequeno
tudo seria tão pouco
tudo


MAURO VERAS

Comentei com Mauro o verso
" de formidáveis pessoas miseráveis... "
Coincidente e interessante o fato de "pessoas" estarem entre estes extremos, entre o formidável e o miserável. Poeta que é poeta sabe o que fazer nestas horas. E Mauro, sacou rapidamente um poema inteiro (I nação - vide acima) que estava escondido sob um único verso deste seu GUETO.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Me poupe!


meu único acesso
ao teu coração
é por este decote V

e vens me dizer
que errou
na escolha da blusa?


RAUL POUGH

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Única


coca
 várias delas; na minha
cola

mas

o que posso fazer
se só tenho olhos
para aquela pepsi ?

afinal

quem vê coca
não vê coração


RAUL POUGH

terça-feira, 24 de novembro de 2009

pg. 40


devagar com a dor
devagar com o andor
que o coração é de barro


NAILOR MARQUES JR.

in: "amor é o que não é" (1997)

sábado, 21 de novembro de 2009

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Doa-se


coração adestrado
com pedigree, vacinado
só não obedece ao dono


LILIAN MAIAL

Elevar


Me desarme com um sorriso
                      vem, me faz calar.

Só não mostre o paraíso
                  se não pode me levar...


RODRIGO GONZATTO

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Cáustica


você tem razão
quando diz que está
me fazendo mal

ainda bem...

afinal, o que seria

deste meu
incauto vício de lutar
guerras perdidas?

e deste oscar
de pior roteiro adaptado
o que seria?

the day after
ocaso, o caos, apocalipse
então?

pois é...

você tem razão
quando diz que está
me fazendo mal

garçon:

por favor
outro coquetel de dores
na mesa oito


RAUL POUGH

Sociedade anônima


eu
tu
ele
nunca nós


NAILOR MARQUES JR.

in: "amor é o que não é" (1997)

domingo, 15 de novembro de 2009

Nº 7


nossas chuvas
embaixo do chuveiro

o sabonete:
louca lasca de tempo:
pedra de esfregar carinho


ANÍSIO HOMEM

in: "Golondrinas" (1991)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Hay que foder-se


pero
sin perder la compostura
jamás


RAUL POUGH

Héracles


Ninguém sabe
degustar
um segredo.

Ele tem a cara
de um câncer.

Ele tem o cheiro
de um medo.

Eu verto silêncios
e aromas de baunilha
nesses dias entristecidos.

Eu perambulo
pelos endereços
inábeis
dos tempos felizes.

Eu sofro
de amores voláteis
desandando
a maionese dos magos.


JULIO ALMADA

in: Em Um Mapa Sem Cachorros (2009)

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Profana


A cor do amor é branca,
e o amor tem uma covinha do lado direito do rosto
e o amor me olha como alguém
que jamais vai tirar a minha calcinha
e gozar o céu dentro de mim.
O amor sempre vai me olhar
como se eu estivesse num altar de papel.
Para o amor, eu sou uma rima
e rima não tem vagina.
Para o amor, eu sou uma ode
com uma ode ninguém fode.
Eu sou um verso alexandrino
jamais tocado pelo herdeiro deste nome.
Eu sou a palavra, e a palavra, a palavra é Deus
Deus ninguém come, mas,
será que beber
pode?


BÁRBARA LIA

in: NOIR (edição independente - 2006)