domingo, 10 de janeiro de 2010

Frívola


Estava no café há mais de meia hora. Sentada à mesa do canto, lia e se divertia com cigarros, da forma como pessoas elegantes o fazem. Tentava se concentrar, mas olhava para a porta quando qualquer um entrava. Não conseguia sair da página quarenta e cinco. Ele estava atrasado, ela estava esperando. Então, entrou, procurou seus olhos grandes e castanhos e sentou-se:
– Estou atrasado.
Ela terminou de ler e colocou um palito de mexer café para marcar a página. Fechou o livro, com aquele ar de desinteresse.
– Tudo bem.
Deu uma última tragada da mesma forma elegante, levantou o rosto e lançou a fumaça para cima. Ficou observando ao se dissipar no ar.
– Estava comprando agrião. Amo agrião, uma longa fila. Me atrasei.
– Tudo bem.
Apagou o cigarro devagar, batendo várias vezes no cinzeiro cheio. Sempre permanecia uma pequena ponta laranja acesa. Não era boa nisso de apagar cigarros, nem de pisar neles enquanto andava. Tentou vários métodos para medir a distância em que o jogava, a velocidade do ar e qual o tamanho do passo. Errava, sempre.
– Estava lendo, enquanto te esperava.
– O que fez de bom hoje?
– Li a página quarenta e cinco.
– Mais alguma coisa?
– Pintei as unhas de vermelho, é outro tom - esticando as mãos.
– Frívola.
– Compulsiva.
– Frívola.
– Lascívia.
– O quê?
– Lascívia é uma palavra tão bonita quanto frívola.


LETICIA FONTANELLA

leticiafontanella.blogspot.com

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